Susana Sanches Arins
subimos ao peom às sete da manhã
chegamos goradas tanta era a solheira
sentadas no meio do oceano verde
dispostas a não continuar a aventura
um velho disse comigo
mais nada comigo
e assinalou com a vara o infinito
mar de tojos e amarelo.
atrás dele fomos
Dolo, Inhaki, Pablo e mais eu.
não sabemos, somos do fojo, não de
sabucedo. é só acompanhar.
e mais nada.
é só acompanhar.
eu temia a vara.
pensei-na para as bestas
picar aguilhoar ferir
marcar com sangue o coiro
com fúria a propriedade
e nós não somos bestas.
mesmo assim caminhei.
no infinito vimos uma greia
pequena como a nossa.
somos poucas.
rodeai.
e mais nada.
fizemos um círculo em volta dos animais.
longe. deixai-nas respirar.
acompanhamos o seu passo.
respirai.
e mais nada.
em silêncio caminhamos o mar verde
de tojo o mar rosa de urzes
a tempestade de crinas.
na calma o bafo das bestas
o passar apressado dos poldros
o porte vigiante do garanhão
o mar da arousa no horizonte infinito
Inhaki assinalou uma peneda
uma porca fugia da nossa direção
com uma corte de bacorinhos atrás
riscados como tigres torpes no apuro
en silêncio caminhamos o mar verde de
tojo. uma carriça rompeu a cantar e não
calou uma nuvem desorientada cruzou
o céu
e em silêncio chegamos ao peão
e levamos as nossas bestinhas ao curro
e o velho disse não era tão difícil
e mais nada.
qual o preço de navegar na calma
ao vento das crinas
o mar verde de tojo?
quanto custa
o mar rosa de urzes
o mar da arousa no infinito?
2 euros o metro quadrado.
e mais nada.
monstros bem visíveis invadem o mar verde
de tojo. chegam com os dumpers as
escavadoras os trailers de cinco eixos
e trabalham a paisagem como nunca nós o
fizemos desaparece a calma
a tempestade vira barulho
não acompanham em silêncio
para que acompanhar
abrir caminhos colocar torres dominar o
vento e mais nada
monstros invisíveis negoceiam em
gabinetes a partição do mar verde em
tojo e amarelo a repartição de
benefícios
2000 euros o metro quadrado
para nós
2 euros
o ruido a fúria
e mais nada.
naquela nossa primeira vez na rapa
após o curro o churrasco e a pulseira de
coiro descansamos da calor à beira do
rio
entre banho e sesta
pablo descobriu-se comido das
carrachas carrachas na barriga das pernas
carrachas nos tornozelos
carrachas nas virilhas
porque não todo é formosura no mar de tojo
verde. admirando as nuvens esquecemos
proteger as pernas que eramos do fojo e não
de sabucedo.
a extirpação da parasita
foi lenta e longa
azeite pinça de depilar dor
pinga de sangue
e mais nada.
não mais nada
da carracha aprendemos a sua fortaleza
a capacidade para não ceivar-se da
presa a resistência a abandonar
e aqui chega a moral da história
não sejamos como as carrachas
sejamos carrachas
aloitemos os dumpers
as escavadoras
os trailers de cinco eixos
com calma
emerjamos do mar verde de tojo
subamos-lhes às crinas
em silêncio
no mar rosa de urzes
respiremos
nunca ceivar
cravemos unhas no aceiro
travemos fortemente os cravos
arranquemos parafusos com os dentes
e derrubemos
deixemos dumpers escavadoras
trailers de cinco eixos
de pernas para o ar
barriga na lama
pasmados com a olhada
no mar infinito do céu.
e se temos que tirar da vara
tiremos
que não somos bestas
mas bem podemos
e mais nada.
Arcos de Riba, abril de 2023
Susana Sanches Arins